sábado, 27 de junho de 2015

Mais um acidente rodoviário grave

Mais um brutal acidente em Coutinho Afonso - esta manhã, mais uma vez, um certamente "condutor consciente e responsável" derrubou novamente o poste telefónico que se vê na fotografia. 


 
Como todos (menos as autoridades) compreendemos, a tragédia só não aconteceu porque não estava nenhum peão a passar...

Mais uma vez se comprova que os semáforos de muito pouco servem se não forem associados a outros meios de segurança, concretamente as lombas - só que da câmara dizem que não podem pôr lombas enquanto a câmara não fizer passeios... Confuso não é?



Relembremos um  anterior acidente igual ao de hoje (posto de 08 de agosto de 2010):

Mais um acidente rodoviário...

Mais uma vez os "selvagens do asfalto" fazem das suas no interior de Coutinho Afonso, e mesmo sobre o (único) passeio da povoação.
 Desta vez, na passada 6.ª feira, foi atingido um poste de madeira, que só ficou de pé graças aos seus cabos telefónicos:


Apesar da violência do embate a "besta" conseguiu fugir. Claro que se estivesse alguém a passar no local...
Já várias vezes demos aqui nota da falta de condições de segurança na circulação dos peões em Coutinho Afonso. Como dizíamos em Setembro de 2008:

Dois anos passados a situação mantém-se exactamente como descrito. Enquanto forem só muros e postes atingidos pelos automóveis parece que os responsáveis políticos e policiais continuam a dormir bem..
Como é sobejamente conhecido - nomeadamente pela Junta de Freguesia -, a povoação não dispõe de qualquer passadeira ou de dispositivos de redução de velocidade, à excepção de dois semáforos nas entradas da povoação que, também como é do conhecimento geral, ninguém respeita - desafiamos as autoridades a confirmar com os seus próprios olhos (nem é preciso radares)esta afirmação.


E ainda outro acidente anterior no mesmo local, num post de 28 de setembro de 2008:

Acidente rodoviário na povoação

Na passada 5.ª feira dia 18 de Setembro registou-se um grave e aparatoso acidente no interior da povoação de Coutinho Afonso.
Pelas 13H30 uma viatura que se deslocava no sentido Cortegaça - Algueirão despistou-se na Estrada Principal, subindo passeio e embatendo violentamente contra um poste de electricidade e o muro de uma habitação.
 O acidente provocou a destruição e queda do poste eléctrico e a avaria da iluminação pública nesta zona (até esta data)

O acidente provocou ferimentos no condutor da viatura, que ficaria encarcerado, sendo a circulação automóvel interrompida até às 18H00.
Como é sobejamente sabido - nomeadamente pela Junta de Freguesia -, a povoação não dispõe de qualquer passadeira ou de dispositivos de redução de velocidade, à excepção de dois semáforos nas entradas da povoação que, também como é do conhecimento geral, ninguém respeita - desafiamos as autoridades a confirmar com os seus próprios olhos (nem é preciso radares) esta afirmação. 
Um grupo de moradores de Coutinho Afonso têm vindo, pelo menos desde 2001, a alertar a(s) Junta(s) de Freguesia para estes e outros problemas de circulação e segurança, sem que seja registada qualquer alteração. Prometemos voltar ao assunto, divulgando os alertas e sugestões efectuados e as respostas (?) obtidas...

domingo, 21 de junho de 2015

A Granja do Marquês

Procuramos informação sobre a história da Granja do Marquês, tendo encontrado um excelente post que é o mais completo possível sobre o assunto, baseado, segundo o seu autor, numa descrição da Força Aérea Portuguesa. Assim, com a devida vénia, transcrevemos um post do Blogue de Lisboa - http://bloguedelisboa.blogs.sapo.pt/aeronaves-da-forca-aerea-levantam-voo-a-168539:


Quinta-feira, 12 de Fevereiro de 2015
AERONAVES DA FORÇA AÉREA LEVANTAM VOO A PARTIR DA GRANJA DO MARQUÊS EM SINTRA
Situada na Freguesia de Pero Pinheiro, no Concelho de Sintra, a Base Aérea nº 1 da Força Aérea Portuguesa ocupa a vasta área que, juntamente com os terrenos em redor, foram a Granja do Marquês, assim denominados por outrora terem pertencido ao Marquês de Pombal. Ali encontra-se também instalado o Museu do Ar e a Academia da Força Aérea, ministrando instrução aeronáutica a milhares de pilotos militares.
Desde há muito tempo que as gentes de Sintra se encontram familiarizadas com as aeronaves sobrevoando constantemente os céus daquela localidade. Porém, a maior parte das pessoas desconhece a história do local e as próprias instalações, apesar do Museu do Ar constituir um local de interesse bastante visitado pelo público. Por essa razão, decidimos publicar a descrição feita pela própria Força Aérea Portuguesa.
Habituados a remontar ás mais antigas origens do povoamento do nosso país, já não nos surpreende o aparecimento de um qualquer testemunho palpável que consiga destrinçar, depurando-a, a lenda fácil da verdade histórica.
Raras são as povoações portuguesas a que os nossos solícitos corógrafos não tenham atribuído uma fundação dos mais arcaicos povoadores.
A Granja do Marquês, ubérrimo solo que ao longo dos tempos foi alimentando populações diversificadas, desde muito cedo que se supunha aproveitada e ocupada e, a atestá-lo, foi descoberta em 1880 uma sepultura da idade Neolítica, encontrada na mesma Granja.
Podemos afirmar que, dois mil anos antes de Cristo vir ao mundo, já nos terrenos da actual Base Aérea Nº 1, se prestava um culto aos mortos, iniciador duma devoção que, pelos séculos fora, dignificaria o homem, colocando-o definitivamente num lugar muito destacado das espécies criadas e apelidando-o de único animal religioso. Embora não restem vestígios destacados, sabe-se que durante a dominação romana estes ricos solos foram explorados e aproveitados bem durante toda a longa permanência árabe.
Quando a vila de Sintra foi, finalmente, incorporada por D. Afonso Henriques no Reino de Portugal, os terrenos actualmente pertencentes à Base mais antiga da Força Aérea Portuguesa, foram doados aos Templários na pessoa de Gualdim Pais. Coma a extinção da Ordem Militar dos Cavaleiros do Templo, em pleno século XIV, passou para a venerável Ordem de Cristo. Em pleno século XVII, e segundo a lenda piedosa, a virgem de Nazaré aparecendo nesta propriedade, determinou a mudança de nome para Granja da Nazaré.
Então, nesta vasta e magnífica propriedade, começou a ser construída por Jâcome de Loureiro, seu proprietário, uma bela ermida à mesma Virgem da Nazaré, que o avô do primeiro Marquês de Pombal, que entretanto adquiriria esta quinta, acabaria de construir em 1701. Passaria inclusivamente a chamar-se Granja do Marquês por ter pertencido ao ilustre Primeiro-ministro de D. José.
Em 1862, a Família do Marquês de Pombal arrendou a referida Granja para nela ser estabelecida a Quinta Regional de Cintra, primeira em Portugal de uma agricultura e zootecnia cientificamente elaboradas, posteriormente transferida no ano de 1887 para as proximidades de Coimbra com o nome de “Escola Prática Central de Agricultura”. Datam desta época grande parte dos melhoramentos efectuados, tanto no Palácio de habitação como nos alojamentos dos empregados, abegoarias e celeiros. Quem pode hoje imaginar que o actual edifício do Comando tenha sido um estábulo de criação de potros e que o Gabinete do Oficial de Dia e as instalações anexas tenham servido de estábulo de vacas de trabalho e de produção leiteira.
Quem poderá ainda imaginar que o primeiro observatório meteorológico da então Quinta Regional de Cintra, se situava na bem lançada torre da actual Capela de Nossa Senhora do Ar.
Quem ainda hoje não fica extasiado com a magnífica obra de engenharia constituída pelo aqueduto que, desde as nascentes de Morelena, transportava a água até ao tanque de rega, hoje transformado em piscina.
Em 1920 D. Amália de Carvalho, descendente do primeiro Marquês de Pombal, foi instada a vender a referida Granja a um grupo de Oficiais que se propôs transformar esta propriedade rural. Dificilmente acreditaria nas maravilhas que estes, a breve trecho, operariam a ponto de passados apenas alguns meses, a imagem patenteada ao grande público era a de um alfobre dos primeiros e intrépidos vencedores do espaço aéreo português.
Estarmos definitivamente, numa nova era de utilização da Granja do Marquês. Nasce assim e aqui, a Base mais antiga da Força Aérea Portuguesa. Desde a longa manifestação do homem neolítico sintrense até ao homem actual que, na Granja do Marquês, eleva aos céus as máquinas que o progresso lhe proporcionou para os dominar, quanto caminho percorrido!
Respiguemos todavia mais alguns factos históricos, estes certamente, mais conhecidos de todos nós porque mais próximos.

A Base Aérea Nº 1
Em consequência da divulgação levada a efeito pelo Aero Clube de Portugal e pela imprensa diária, o Dr. António José de Almeida apresentou, em 21 de Junho de 1912, à Câmara dos Deputados, um projecto de lei tendente a criar no nosso País um Instituto de Aviação Militar através do qual se previa a construção dum “porto aéreo nas margens do Tejo”. Pouco tempo depois, a direcção do citado Clube nomeia duas comissões, para estudarem respectivamente a organização duma escola de aviação e dum serviço militar de aeronáutica.
Foram elaborados trabalhos no seio do Aero Clube de Portugal, que levaram à criação da Escola Aeronáutica Militar, precursora da Base Aérea Nº 1 e do Serviço Aeronáutico Militar, antecessor da Força Aérea.
A partir dos estudos feitos pela já referida Comissão especial, nomeada em Agosto de 1912 pela direcção do Aero Clube Portugal, foi decretada pelo Congresso da República e promulgada em 14 de Maio de 1914 pelo Presidente da República Manuel Arriaga, a lei que cria a Escola Militar de Aviação, com serviços de aviação e serviços de aerostação e ainda com uma secção de marinha anexa.
A construção da Escola iniciou-se em Vila Nova da Rainha em 5 de Abril de 1915 e em 1916, Santos Leite, num DUPERDUSSIN, realiza ali o primeiro voo. Em 1 de Outubro, sob o comando do Tenente Coronel de Engenharia Hermano de Oliveira, dá-se inicio oficial ao primeiro curso de pilotagem com aviões FARMAN e CAUDRON G-3. Em Maio do ano seguinte, na Sociedade de Geografia de Lisboa, procedeu-se solenemente à cerimónia de distribuição dos brevets aos 15 oficiais que concluíram esse histórico curso, dos quais 3 pertenciam à Marinha. Eram brevets militares que lhes vieram a ser concedidos por várias escolas francesas (Chartres, Juvisy, Avord, Châteauxroux, etc.).
Devido às péssimas condições da pista e à insalubridade da região, a Escola è transferida em 5 de Fevereiro de 1920 para a Granja do Marquês.
Em 14 de Agosto de 1926, o Cardeal Patriarca de Lisboa, D. António Mendes Belo, oferece e entroniza na capela da Granja do Marquês uma imagem de Nª Senhora da Assunção, adquirida em Paris; ficou consagrada como Nª Senhora do Ar, o que foi mais tarde confirmado em 1960, pelo Papa João XXIII, com o breve Pontifício “ALIGERA CYMBA”, sendo então proclamada Padroeira dos Aviadores Portugueses. Nesse mesmo dia festivo de 1926, foi recebido e solenemente benzido pelo mesmo Cardeal Patriarca, o Estandarte da Escola, oferecido por uma comissão de senhoras de Sintra e por elas bordado.
A Escola militar de Aviação, viu posteriormente, em 1928, o seu nome alterado para Escola Militar de Aeronáutica, nome que manteve até à sua extinção.
Em Dezembro de 1937, o Decreto Nº 28.401 remodela profundamente o Exército com especial ênfase para a arma de Aeronáutica, que é substancialmente desenvolvida; é este decreto que cria a Base Aérea de Sintra. Mas torna-se necessário esperar quase dois anos, para em Outubro de 1939, o Decreto Nº29.957 dar à Granja do Marquês o nome que ainda hoje ostenta: Base Aérea Nº 1.
Foi portanto na Granja do Marquês (Base Aérea Nº 1 a partir de 1939) que durante longos anos se formaram os pilotos e especialistas da Força Aérea. O desenvolvimento da Força Aérea, com substancial aumento de quadros a partir dos inícios dos anos 60, levou a formação de especialistas para a Base Aérea Nº 2, e obrigou ao desdobramento da instrução básica de pilotagem com uma esquadra na Base Aérea Nº 1 (T-37) e uma esquadra na Base Aérea Nº7 (T-6). Extinta a esquadra de instrução de S. Jacinto, manteve-se a formação de pilotos na Base Aérea Nº 1 até Junho de 1993.
Complementando a actividade de instrução, a acrobacia em formação foi desde sempre apanágio da Esquadra de T-37, o que motivou a sua escolha pelo CEMFA, em 1977, para levar ao grande público a nível nacional, a imagem da Força Aérea, contribuindo para a sua divulgação e suscitar vocações na juventude, bem como, representá-la em festivais internacionais, através da patrulha acrobática “ASAS DE PORTUGAL”.
Além da instrução, a fotografia aérea, é uma actividade com largas tradições na Granja do Marquês. Embora efectuada logo desde os primeiros tempos e com importância crescente, foi a partir de Outubro de 1965 que, por determinação do CEMFA, a Base Aérea Nº1 passou a ter atribuída a missão de fotografia aérea da Metrópole. Esta Missão, está hoje largamente excedida, realizando importantes trabalhos à escala nacional, tais como: fotografia para cadastro, urbanização hidráulica agrícola, fomento agrícola e florestal, estradas, caminhos-de-ferro, recursos hídricos, saneamento básico, controlo do meio ambiente, habitacional, levantamento aeromagnético, levantamentos pontuais para pesquisa de recursos terrestres (pirites do Alentejo, Moncorvo, etc.); colaboração com o sector das pescas no continente, Açores e Madeira.
Em Outubro de 1987 foi assinado pelo Governo Português um contrato de aquisição de 18 aviões de instrução Epsilon e foi decidido que a sua Base de operação seria Sintra.
A fase de instrução nos aviões Epsilon veio substituir totalmente a instrução elementar de pilotagem em aviões Chipmunk e parte da instrução básica.
O primeiro avião Epsilon voou de Tarbes (França) para Sintra em31 de Janeiro de 1989 e a cerimónia oficial de entrega deste avião, presidida pelo então Ministro da Defesa Nacional, Eurico Silva Teixeira de Melo, teve lugar em 1 de Fevereiro desse mesmo ano.
Em 10 de Maio de 1990, foi esta unidade dotada de uma Esquadra de 12 aviões CESSNA FTB 337, transferidos da então Base Aérea Nº2.
Em 15 de Junho de 1993, a Esquadra de Instrução 101 foi transferida para a BA11 (Beja) e em 6 de Julho de 1993 a Esquadra de Transporte 502, equipada com aeronaves C212, que estava sediada na BA3 (Tancos) foi movimentada para esta Unidade, em consequência da reorganização que se verificou na Força Aérea.
Em 25 de Julho de 2007 realizou-se a cerimónia de encerramento da actividade da frota FTB-337G.
Texto: Força Aérea Portuguesa
Fotos: Carlos Gomes


domingo, 7 de junho de 2015

Os Ratinhos e a Granja do Marquês

Ratinhos era a designação pela qual eram conhecidos os trabalhadores migrantes, originários das Beiras, que sazonalmente se deslocavam das suas terras para o trabalho agrícola da ceifa ou da apanha da azeitona no Alentejo, no Ribatejo ou mesmo na nossa região.

Pois exatamente perto de nós, na Granja do Marquês, existem ainda vestígios da presença destes migrantes das décadas de 40 e 50 do século passado: são um conjunto de edifícios em ruínas defronte/ junto ao acesso principal à Base Aérea n.º 1 de Sintra onde alguns aí dormiam; existe também um edifício onde se realizariam bailes, que certamente permitiriam o convívio entre estes migrantes e autóctones.


 
Um interessante artigo cobre os Ratinhos no Alentejo em www.prof2000.pt/users/avcultur/luisjordao/almanaque/.../Page30.htm:

MIGRAÇÕES
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OS RATINHOS
 
Migrações eram deslocações de gentes dos seus locais de origem para outros, à procura de melhores proventos para desafogo da sua vida.
Hoje, lembrei-me de ir ao encontro dos ratinhos, trabalhadores rurais, vindos das Beiras, que demandavam a minha região na época das “assêfas”(1), período que abrangia sobretudo os meses de Junho, Julho e Agosto, no tempo em que os campos se doiravam de espigas e o Alentejo se intitulava o “celeiro de Portugal”.
  
 
Ceifas no Alentejo – Imagem de marca de um restaurante típico de Aveiro.
 
Lembro-me muito bem de os ver nas décadas de quarenta e cinquenta do século passado, formando “camaradas”(2) que se distribuíam pelas herdades dos grandes latifundiários, conforme já fora combinado, antecipadamente, entre aqueles e o respectivo manageiro, seu representante. Eram homens simples, laboriosos, humildes, francos, fraternos, pobres de bens materiais, mas ricos de valores éticos e comportamentais. Viajavam de comboio até Ponte de Sor e, se o contrato não se formalizara com transporte, iam a pé para os montes de acolhimento, só descansando para consolar o estômago com bocados de broa e vinho envinagrado.
Ao passarem pelas Galveias (minha terra), formavam colunas ao descerem a estrada macadamizada até ao alto da Azinhaga de Avis, embrenhando-se depois por caminhos de pé posto. Por vezes, surgiam alguns cachopos mais atrevidos que, com o intuito de os ridicularizar, diziam:
– Ratinhos da Bêra,
Cómim pão e dêxam a farrenhêra!
                        e
– Ó ratinhos, rátim o pão,
Rátim o quêjo e o focinho do mê cão!

Eles, serenos, não lhes ligavam ou, a rir, respondiam-lhes:

– Olhem que não!
Comemos a farrenhêra e dêxamos o pão!
                         e
– Somos ratinhos, ratamos o pão e o quêjo,
E às meninas, pedimos um bêjo.
Chegados aos montes, ocupavam as camaratas que lhes estavam destinadas, arrumavam os sacos com os poucos haveres que traziam e, enquanto descansavam, esperavam pela papança a que ferravam o dente para enfiar na tripa. Alguns dos mais velhos garganteavam lamentações sobre o raio da vida que lhes coubera.
Assim que o sacristão do céu acendia as primeiras estrelas, iam deitar-se em cima de esteiras de bunho e, cansados, dormiam a sono solto. No dia seguinte, antes do Ti Manel(3) nascer, estavam preparados para enregar a safra.
Habitualmente, os ratinhos comiam e bebiam por conta dos lavradores à “boca livre”(4), cujos comeres, substanciais, à base de feijão frade, feijão catarino, grão, batatas, sopas de pão “todo um”(5) e bóias de toucinho e enchidos de porco, eram levados por um criado da lavoura designado por mantieiro. Sendo assim, recebiam pouco dinheiro que forravam para governo da família. Porém, a maior parte das “camaradas” trabalhava a seco, isto é, só por dinheiro, sendo responsável pela sua fraca mantença, não abdicando cada um dos seus membros, de poupar, poupar, chegando até à sovinice.
Normalmente, as “assêfas” começavam pela aveia, depois o centeio, a cevada e por fim o trigo.
Era um trabalho árduo! Feito de sol a sol, debaixo de um calor tórrido, desempenhado corajosamente, encharcava-lhes o corpo de suor e, eles, com ansiedade, esperavam, de quando em vez, a vasilha de água que emborcavam com sofreguidão, para se dessedentarem. Mesmo assim com o sol em brasa, algum dos mais afoitos interrompia o trabalho, erguia a cabeça e, com voz vibrante, desabafava:
Fui ao livro do destino,
Minha sorte procurar.
Em todas as folhas li,
Que nasci p`ra trabalhar.
Chegados ao pôr-do-sol desapegavam do trabalho e, se as noites estivessem quentes, estendiam uma manta sobre o restolho e ali mesmo se entregavam a Deus para que lhes desse um santa noite e forças para o dia seguinte.
Concluídas as “assêfas”, faziam as contas. Desta vez, o manageiro oferecia uma boa pinga, cujo efeito se notava na algazarra que alvoroçava os montes por meio de cantos, choros, gritos, agradecimentos e vivas.
No dia seguinte, tocava a reunir e faziam-se ao caminho do regresso. Chegados a casa, tinham caloroso acolhimento, sendo recebidos com gritos de júbilo e lágrimas de saudade.
As minhas raízes ruralista e campesina de que me orgulho e nunca esquecerei, levaram-me com este pequeno texto, a perpetuar o trabalho destes homens “d`uma cana” (6) que, de pé firme e mão vigorosa, ceifavam o pão que nos matava a fome.
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(1) – as ceifas ● (2) – Ranchos ● (3) – Sol ● (4) – Barriga cheia ● (5) – Escuro ● (6) – Rijos

sábado, 6 de junho de 2015